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A vida pós pós-depre

Em junho do ano passado escrevi um texto (link) falando sobre a maluquice que é melhorar depois de anos ruim da cabeça, e recebi mensagens bem legais, principalmente de gente que estava enfrentando dificuldades. E por isso resolvi escrever esse outro agora, depois de mais um ano desse processo. Com o passar do tempo, o público desse blog se dividiu em dois grupos: meus amigos que gostam de ler sobre meus vexames, e pessoas aleatórias que se identificaram com meus problemas de ansiedade e começaram a me acompanhar. Vocês, os aleatórios, são os mais importantes, e espero conseguir dizer algo que ajude.

Hoje fica claro pra mim que, em determinado momento da minha recuperação, eu me dei por satisfeito pelo simples fato de não estar sofrendo, e acho que todo mundo passa por isso. Só de não estar em depressão, ou tendo crise de pânico do nada no meio da tarde, foi uma melhora tão grande que eu criei uma vida agarrada nisso. Porém é uma vida bem limitada, na qual você cria uma bolha de segurança muito dificil de romper, porque rompe-la pode significar se expor há algo que te faça passar por tudo aquilo de novo.

A pegadinha, no entanto, é que a gente acha que o risco mora na exposição, mas ficar muito tempo patinando no mesmo lugar é bem pior. O Freud tem uma frase boa sobre isso: “Quando a dor de não estar vivendo for maior que o medo da mudança, a pessoa muda”. Eventualmente, a gente precisa aceitar que essa bolha que criamos não é mais o suficiente. Se por acaso você está nesse momento da bolha, não se martirize. Vai levando, um dia menos pior que o outro, que de repente vira um dia melhor que o outro.  Ansiedade e depressão nos prende dentro de nós mesmos, expandir novamente leva um tempo. Só não se proiba de querer mais. E tédio é um bom sinal. Quando ficar em casa, que é lugar seguro, começa a ficar um tédio, significa que a gente não está mais satisfeito.

  E aí, quando a insatisfação chega ao limite, a gente faz a loucura de tentar de novo.

  Ir em festa, voltar a fazer esporte, a trabalhar, ver as pessoas de novo, ir em date. No começo tudo é uma merda ou parece muito dificil ou dá ansiedade. A caminhada de recomeçar é longa demais, a gente se frustra pelas coisas não darem certo logo de cara. É também um exercicio de paciência. E a cada dificuldade vem o medo de retroceder tudo de novo. Sobre isso, lembre-se que é possível ficar nervoso, frustrado ou triste sem significar uma mega crise. Pessoas normais sofrem dessas coisas o tempo todo; a gente é que esquece que há uma enorme distância entre um contratempo e uma crise depressiva.  O contrário de depressão não é felicidade o tempo todo. Tá ok ficar triste de vez em quando. Se te cobrarem por isso, diz que o Paulo deixou.

Eu, inclusive, passo por isso direto. Demorei pra aceitar, por exemplo, que uma parte dos meus trinta anos foi completamente perdida em total infelicidade. Pensar nisso me deixava puto, e depois me jogava pra baixo. Hoje fico menos puto. Outro exemplo, no fim do ano passado fui chamado pra participar do canal de um apresentador famoso. Eu aceitei participar, me preparei, mas na hora de entrar ao vivo, literalmente momentos antes, eu congelei. Comecei a ver a audiência do programa, 20, 30, 40 mil pessoas assistindo ao vivo e não consegui entrar. E não entrei. Foi uma merda, morri de vergonha com a situação, entrei na nóia de que estava piorando de novo… enfim, é nessas horas que terapia vale ouro, porque aí você conversa e seu terapeuta te mostra que foi só um contratempo e não um sinal do apocalipse. De qualquer maneira, nunca mais me chamaram pro programa. Talvez nunca chamem. Hoje acho que conseguiria participar, naquela época eu não estava pronto. E é assim que vamos. Por mais frustrante que seja, tentativa e erro é uma parte importante do processo.

Falando disso tudo, percebo como é curioso que exista tanta informação sobre como lidar com depressão e ansiedade, mas pouquissima sobre como lidar com o pós. E os dois momentos tem seus desafios.

Um deles é lidar com o medo de dar tudo errado e ter que enfrentar tudo aquilo de novo, outro é aprender a respeitar seu próprio tempo, sem julgamento; aceitar que tem coisas que são fáceis pra todo mundo mas dificeis para você, e que você está fazendo o melhor que pode e isso já é muita coisa. Não adianta virar pra um diabetico e dizer “vai caralho, produz insulina aí”. Também não dá pra encontrar um ansioso e dizer “já tentou não ficar ansioso?”. Ficar se comparando com os outros, ou sofrendo por achar que está atrás dos outros, é perda de tempo. É injusto, óbvio, porque a maioria da pessoas não precisa de tanto esforço para ficar bem, mas é o que é. A maioria também faz muita merda.

A questão é aceitar quem você é, inclusive a montanha de problemas, ficar feliz pelo tudo que você já superou e tentar buscar essa melhor versão de nós que criamos na nossa cabeça. No fim, todo mundo tá perdido. A gente pelo menos sabe disso, e a ironia é que só sabendo que está perdido a gente consegue se encontrar.

 
 
 

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