Torcida única, arquibancada 150 reais. Não tem radinho, é smartphone. Pré-jogo com tatiquês. Cabelos e chuteiras coloridas, hino que ninguém liga.
De um lado posse de bola sem chances de gol; do outro, casinha fechada para jogo reativo. Organizada canta, numerada vaia. Depois o inverso. É gol.
Não pode tirar camisa, não pode provocar o rival, não pode protesto político, não pode o gesto do artilheiro, do matador, do ceifador. Pode uma dancinha ou erguer as mãos pro céu.
Jogo recomeça. Cai cai, rodinha no juiz, falta na meia-lua. Cinco na barreira e a Maldição do Ronaldinho: um coitado deitado atrás, para evitar a cobrança por baixo. Quase cinco minutos para cobrança e o sujeito, obviamente, isola.
Intervalo, entrevistas, clichês: volta por cima, levantar a cabeça, ouvir o professor. Mesa tática, mapa de calor, câmera invertida, mas os melhores momentos têm dois, três lances no máximo.
Recomeça o jogo. Time que está perdendo tira um dos três zagueiros e coloca mais um meia. Time que está ganhando recua.
Segundo tempo morno. Votação do craque do jogo, pontuação dos atletas no cartola.
O estádio anuncia a renda e a torcida bate palma.
Começa a pressão do time atrás no placar. Bombardeio na área. Goleiro defende e cai pedindo atendimento médico. Minutos depois, outro chute, e o goleiro cai novamente. Cada chance do adversário é um tiro que derruba o arqueiro ferido.
A desorganização aumenta conforme o tempo passa: cinco substituições para cada lado, não há tática que aguente.
Cruzamento na área, a bola bate na coxa do zagueiro e sobe para o braço. O estádio grita. Rodinha em volta do juiz. Central do apito.
Três minutos do homem de amarelo com a mão na orelha.
Replay. O mesmo lance tem dia que é pênalti, tem dia que não. Comentarista de arbitragem diz que não foi.
Juiz vai pro VAR.
Mais três minutos.
Ele volta, caminha até o meio do campo só para aumentar o drama, então aponta o pênalti. Central do Apito muda seu comentário e diz que o juiz acertou sua interpretação, conforme uma nova orientação que começou a valer ontem de madrugada. Depois de quase dez minutos de jogo parado, bate-se o pênalti. É gol.
O jogo acaba: empate.
Um técnico culpa a arbitragem, o outro cita a posse de bola para justificar o desempenho da equipe. Ambos se irritam com o jornalista. Na internet, discussão sobre se o treinador perdeu o grupo. Na falta de argumentos melhores, faltou raça. Tem que trocar tudo, mandar todo mundo embora e subir todos os meninos da base. Torcida pede a troca de técnico. Nome do Gallardo se torna trending topic. A noite de futebol termina assim, entre especulações e xingamentos.
Esse é o NeoFutebol - em campo, muitas vezes estéril. Fora dele, quase sempre histérico.